Álvaro Filho |
O cangaço foi um movimento social que ocorreu no sertão nordestino no fim do século XIX e início do século XX. Com chapéus e roupas de couro, os cangaceiros, em sua maioria, jagunços, capangas ou empregados de latifúndios, saíam pelo Sertão com punhais e armas de fogo na cintura, aterrorizando cidades com roubos, sequestros e saques. A disputa de terra, o coronelismo, a vingança e a revolta em relação à miséria do Nordeste e o descaso do poder público deram origem ao movimento. Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, foi o cangaceiro de maior destaque. O cangaço começou a desaparecer no governo Vargas, mas as suas roupas de couro, usadas para andar pela caatinga, ainda são símbolos da cultura nordestina. Orgulhoso de suas origens, o paraibano Álvaro Filho carrega o chapéu de cangaceiro nos torneios, ideia lançada pelo pai em 2011. Subir no pódio vestido a caráter virou sua marca registrada.
- O Alvinho é guerreiro, tem sangue do Nordeste, por isso, usa o chapéu de couro para representar o povo nordestino, que é muito guerreiro. Ele é um menino humilde e de muita garra. Nunca me deu trabalho ou fez algo de errado. Gosta muito de dormir, mas coloca o despertador e acorda cedo todo dia, treina até machucado, com dor. Tem uma vida regrada e lida bem com a pressão por resultados. No ano passado, jogou o Circuito Mundial com um cara (Ricardo) que tem três medalhas olímpicas - contou o pai, Álvaro Morais, que trabalha na construção civil.
Alvaro Filho se espelha no pai em busca do sucesso no vôlei de praia e sonha com os Jogos de 2016 (Foto: Carol Fontes) |
No ano passado, Álvaro Filho colecionou importantes conquistas. Além do título do Grand Slam de Gstaad, na Suíça, o paraibano foi vice no Mundial, em Stare Jablonki, no qual foi eleito o melhor jogador, a revelação e o atleta que mais evoluiu. Um dos principais nomes da nova geração, o jovem de 23 anos teve a chance de conquistar pela primeira vez uma etapa do Circuito Brasileiro em João Pessoa, sua terra natal, mas acabou se despedindo ainda na primeira fase. A derrota não abalou a promessa, que sonha representar o Brasil nos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016.
- Disputar as Olimpíadas de 2016 é um grande sonho. Quero representar o Brasil e a Paraíba, seria o auge. E vou levar o meu chapéu, que virou um acessório obrigatório na bagagem nas viagens por ter uma identificação com a nossa terra. Era a minha primeira viagem para a Europa, um Country Cota do Circuito Mundial. Eu e o Vitor Felipe, que era meu parceiro na época, usamos o chapéu na Suécia, onde vencemos as duas etapas do circuito local que disputamos - contou o jovem, que também usou o acessório quando conquistou a prata no Mundial, ao lado de Ricardo.
Álvaro Filho bate bola com o pai nas areias da Praia de Cabo Branco, onde treina (Foto: Carol Fontes)
Antes de se arriscar nas areias, Alvinho gostava de jogar futsal e futebol. Achava que o vôlei era "esporte de mulher" e relutou para experimentar a modalidade. Por influência do pai, assistiu a uma aula de vôlei aos 15 anos e nunca mais parou.
- Eu achava o ambiente do vôlei bom e queria tirá-lo do futebol, que tem um ambiente meio pesado no Nordeste. Ele não gostava de vôlei, dizia que era esporte de mulher, mas eu o obriguei a assistir a uma aula e deu certo. Se ele for para 2016, vai ser uma boa. Viemos acompanhando ele desde pequenininho, nos qualifyings e outros torneios, e percebe o desenvolvimento dele. O Alvinho evoluiu muito e virou um jogador completo. Aprendeu a controlar o emocional, que é muito importante no vôlei de praia. Às vezes, ficam marcando um atleta direto, parece uma arena de gladiadores. Hoje, ele está mais forte, não sente tanto o jogo e se supera ao enfrentar os grandes times. Tem muito jogador bom no Brasil, mas que não joga bem lá fora - disse o pai-coruja.
Álvaro Filho define o seu estilo de jogo como "agressivo e inteligente". Em busca do sucesso, ele se espelha em Emanuel e Ricardo, a quem considera um "gênio". Os conselhos do pai também são fundamentais em sua vida, principalmente, nos momentos difíceis, como no momento em que decidiu o caminho que iria seguir, há cinco anos.
- Um dos momentos difíceis da minha vida foi na adolescência. Eu tinha 17 para 18 anos quando passei no vestibular para engenharia civil e não estava conseguindo render nem na faculdade e nem nos treinamentos. Precisei optar numa época que eu ainda não sabia o que queria direito. Meu pai e minha mãe disseram para eu seguir no vôlei. Devo muito a eles. Hoje, sou muito feliz. Não sei se eu seria tão feliz como eu sou se tivesse em uma carreira acadêmica. Devo muito a eles. Os ensinamentos que o meu pai passa são em relação à vida. Meu pai diz que eu tenho que aproveitar a vida, não ser oito nem 80 e ter sempre a cabeça no lugar. Se ele me fala assim: "Hoje, se eu tivesse a cabeça que eu tenho com a sua idade, iria dominar o mundo". Eu tento pegar um pouco dessa cabeça porque ele é muito inteligente para a vida - finalizou.
Vice-campeão do Mundial, na Polônia, Alvinho arrancou palmas com seu chapéu de cangaceiro (Foto: Divulgação/FIVB)
Por Carol Fontes/Globo.com