quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Dupla de Ricardo em Londres, Cunha para aos 29 anos: 'Quero vida normal'

Pedro Cunha: Atleta se aposenta aos 29 anos Foto-Helena Rebello
Uma decisão bem pensada, mas ao mesmo tempo repentina, vai deixar o vôlei de praia brasileiro desfalcado de um de seus principais atletas na atualidade. Quinto colocado nos Jogos de Londres e atual vice-líder do Circuito Brasileiro ao lado de Ricardo, Pedro Cunha resolveu aposentar-se do esporte de alto rendimento aos 29 anos. Influenciado por uma lesão crônica no joelho direito e pela falta de motivação após as Olimpíadas, o carioca optou por encurtar a carreira nas areias para ter “uma vida normal”. Com a despedida marcada para o Open de Maceió, em março, Pedro fez um balanço de sua trajetória, apontou seu sucessor como destaque do fundo de quadra e falou sobre os planos para o futuro.

- A vida de um atleta de alto desempenho é muito sacrificante como um todo. São quase 24 horas por dia, sete dias por semana de dedicação. Esse desgaste pesou na minha decisão. Quero tentar ter uma vida normal agora. Trabalhando, mas depois indo para casa, tendo um dia normal.

Por que parar tão cedo?
Na verdade não é tão cedo assim. Esse seria o meu 13º ano jogando, e foram anos bem cansativos e em que me dediquei bastante. Também pesaram as várias lesões que eu tive, mais a falta de motivação desse último período depois das Olimpíadas. Eu quero ter uma vida normal.
 
O resultado nas Olimpíadas (eliminação nas quartas de final) então pesou?
O resultado em Londres não foi o esperado, mas também não foi tão ruim assim. Perdemos para os campeões olímpicos (os alemães Brinck e Reckermann), que bateram todo mundo, cada um em uma fase diferente. Se tivéssemos encontrado com eles só na final, seríamos medalhistas. Se fosse nas semis, poderíamos ter ido ao pódio. Acho que isso não influenciou muito na minha decisão. Foi mesmo pelo cansaço natural da rotina de qualquer atleta de alto desempenho. Sofro há mais de um ano com uma tendinite braba no joelho direito. Nessas duas últimas semanas eu tomei a decisão.

Pedro explica as razões que o levaram a anunciar
a aposentadoria precoce (Foto: Helena Rebello)
E quando você contou para o Ricardo?
Logo depois da final em João Pessoa. Eu já estava pensando em parar total, mas pensei melhor e resolvi fazer o torneio de Maceió como despedida. Eu não queria que essa notícia influenciasse nosso desempenho em João Pessoa. Acho que fiz o certo, jogamos bem até a final, mas passei mal de noite e, depois, em quadra.
 
Como o Ricardo reagiu?
Ele ficou surpreso, assim como todas as pessoas para quem eu estou contanto. Ele me perguntou o motivo, ficou ouvindo o que eu tinha para explicar. Eu quis que ele fosse o primeiro de todos a saber, fora minha família. Não só pelo fato esportivo, por ele ter que procurar um outro parceiro, mas por ter sido o cara que dividiu comigo os bons e maus momentos nos últimos dois anos. Ele merecia essa consideração.
 
Alguém tentou te fazer mudar de ideia, tipo a Maria Elisa (parceira de Juliana e grande amiga do jogador)?
A Maria tentou por uns 10 segundos e já pedi para ela parar. Era uma decisão tomada, então é só um comunicado. É uma decisão sem volta e que foi bem pensada nos últimos meses. E ninguém vai me convencer do contrário.
 
Você jogou com atletas como Pará, Franco, teve uma temporada excelente (2010) com o Thiago, se entrosou de cara com o Ricardo... Quem foi o seu melhor parceiro?
Acho que o Ricardo. Até pelo fato de ter sido, na minha opinião, o maior jogador de vôlei de praia que eu já vi em ação. Muitos falam do Kiraly (Karch Kiraly, campeão olímpico na quadra e na praia), mas já o vi em final de carreira. Como eu e o Ricardo tivemos uma química muito rápida, pudemos aproveitar todos os momentos. Isso é muito importante no vôlei de praia, e conseguimos quase dois anos bem intensos.
 
O que você leva de melhor e o que quer esquecer do vôlei de praia?
De melhor levo as minhas vitórias. Foram 27 títulos e, como todo atleta, sempre gostei de ganhar. Os momentos finais, cada momento que eu ganhei, os momentos de comemoração foram muito importantes, os mais legais da minha carreira. E o que eu levo de pior é o desgaste físico mesmo. Não só de lesões, mas é que a vida de um atleta de alto desempenho é muito sacrificante como um todo. São quase 24 horas por dia, sete dias por semana de dedicação. Esse desgaste pesou na minha decisão. Gostaria de tentar ter uma vida normal agora. Trabalhando, mas depois indo para casa, como um dia normal.

Jonas Reckermann tenta bloquear Pedro: dupla brasileira cai nas quartas em Londres (Foto: Agência AP)


Que título faltou no seu currículo?
Pelo menos uma medalha nas Olimpíadas fez falta. Em Londres tínhamos totais condições, mas perdemos para o time campeão. Essa é a verdade. Acho que poderíamos ter ido mais longe. Também sinto falta de um campeonato mundial. No primeiro eu tinha bastante chance de ser campeão, mas me lesionei na semana anterior. Então não foi a falta só do título, mas de ter participado após ter me preparado tanto e não consegui jogar.
 
Em 2011 você teve um fim de parceria conturbado com o Solberg. Vocês se falam hoje em dia?
Não. Acho que ele teve atitudes que não condizem com o relacionamento profissional que a gente tinha. E hoje não temos relacionamento algum. Sempre tratei meus parceiros com bastante responsabilidade. Mas ele, em duas oportunidades, em momentos difíceis para mim, mostrou que não tinha nenhum respeito por mim como pessoa e profissional.

Solberg e Cunha: parceria terminou de forma
conturbada na temporada 2011 (Foto: FIVB)
Nos últimos anos (2006-2008, 2010 e 2011) você dominou a premiação de melhor defesa do Circuito Brasileiro. Quem você aponta como seu sucessor?
Como só faltam mais dois torneios, dependendo eu também participo da disputa. Mas quem tem me dado muito trabalho nos últimos torneios é o Bruno Schmidt. Vai ganhar o título da temporada fácil. Ele deu uma evoluída boa nos últimos tempos, cresceu muito em nível técnico e tem tudo para tomar o meu lugar como melhor defensor do Brasil.

O que você achou da implantação da seleção de vôlei de praia?
Costumo falar que eu era o jogador que estava mais satisfeito na seleção. Houve um conjunto de fatores que só me favoreceu. Pode dar certo como pode dar errado, mas todos ali estão focamos com o mesmo objetivo, e é assim que começa qualquer equipe vencedora. Há detalhes que tanto os jogadores quanto o público não estão acostumados. O tempo vai acertar, ajudar todos a se acostumarem. Você passa dias e dias treinando com seus adversários, e isso é bem esquisito. Mas acho que é unânime dentro da seleção que isso só tem a elevar o nível dos times brasileiros.

Acha que esse formato também favorece a escolha de um novo parceiro para o Ricardo?
A seleção vai ser uma coisa boa para ele, porque deve acabar puxando alguém dali para jogar com ele. Embora eu tenha minha opinião, não conversei com ele sobre isso. É algo que ele tem que decidir.
 
Você falou de planos, de ter uma vida normal. O que você pretende fazer depois da etapa de Maceió?
Pretendo não fazer nada. Quero ter um ou dois meses sabáticos para realmente não fazer nada, pensar no que vou fazer, ver se surge alguma coisa interessante e também me preparar para qualquer coisa que decida fazer. Sou formado em marketing, mas nunca estive no mercado de trabalho. Gostaria de me preparar bem, estudar para não tomar nenhuma decisão precipitada.
 
Cogita trabalhar com o vôlei em si?
Comissão técnica não, talvez em algo nos bastidores. No começo, principalmente, quero algo que não me faça viajar muito. Já viajei bastante nos últimos anos. O que eu gostaria, neste momento, é ficar um pouquinho mais na minha casa.

As principais conquistas de Pedro Cunha
Quinto colocado nos Jogos de Londres 2012
Bicampeão do Circuito Brasileiro - 2007 (com Franco) e 2010 (com Thiago)
Bicampeão mundial Sub-21 em 2001 e 2003
Campeão Brasileiro sub-21 em 2003
738 vitórias - 390 no Circuito Brasileiro, 344 no Circuito Mundial e quatro nas Olimpíadas

 *Por Helena Rebello/SporTV.com